Geraldo Pereira é um mal-humorado profissional. Ele leva uma vida normal, atuando como revisor de trabalhos acadêmicos e colunista em uma revista digital de literatura.
O que ganha não é muito, mas pelo menos paga o aluguel de um apartamento modesto, no qual faz questão de viver isolado do mundo. Assim como também garante suas idas até o botequim do Edinilson para tomar seu café de origem duvidosa e o pão na chapa esquisito, onde aproveita para reclamar da vida e confirmar que é melhor continuar longe das pessoas.
Dono de uma personalidade peculiarmente sarcástica e de respostas diretas (diria até indesejáveis) demais, Geraldo não seria uma companhia que você escolheria em um primeiro momento. Muito menos o consideraria uma pessoa adequada para escrever um livro de autoajuda.
No entanto, Aloísio (editor da revista de literatura e “amigo da onça” de Geraldo) acha que o rapaz pode escrever qualquer coisa, só pelo fato de ser um bom colunista e ter pós-graduação. Não tem quem tire de sua cabeça que ficarão ricos, pois irão revolucionar o mundo e entrarão logo na lista dos best-sellers de autoajuda.
Afinal, basta escrever qualquer frase de impacto que todo mundo vai comprar os livros. E, por mais que tente fugir de todas as formas possíveis, sobra para Geraldo a missão de colocar no papel tudo o que ele sabe sobre ter sucesso na vida… ou não… dependendo de como você interpreta…
“A glória! Esse seria o nome do livro. Eu me sentia ao mesmo tempo exultante e estúpido. […] O Melhor Livro de Autoajuda do Mundo era, ao mesmo tempo, icônico e estúpido, vazio e completo.”
Olhando apenas o título desse livro, jamais passaria pela minha cabeça que encontraria de tudo, menos a famigerada autoajuda. Conheci a obra através do contato de um agente literário, que me convenceu quando li a sinopse. É uma proposta audaciosa e inusitada, para a qual decidi dar uma chance e não me arrependi.
A narrativa é em primeira pessoa e vemos os fatos unicamente pelo ângulo de Geraldo, nosso protagonista (ou grande vítima, se preferir assim, rsrs).Como primeiras impressões, percebi que é um homem introspectivo e que evita a todo custo contato com outras pessoas.
Contudo, isso não tem muito a ver com timidez, mas com impaciência para lidar com a sociedade. O que me lembrou personagens icônicos, como D. Anésia ou mesmo o Saraiva da ‘Zorra Total’ (sim, eu via esse quadro quando era criança e acabei de denunciar minha idade, rsrs).
E, confesso, ele me conquistou no primeiro parágrafo. Isso porque, logo no início, somos apresentados ao personagem e entendemos seus motivos de ser assim com as pessoas.
Seu único momento de “lazer” é quando atravessa a rua para ir até o Edinilson, um boteco bem no estilo pé sujo, para tomar seu café de inspiração/calma/crise existencial (do qual ele descreve com tanta poesia a falta de higiene, que não sabia se ficava com nojo ou se ria. Ok, talvez um pouco de cada).
O trajeto do rapaz é tão previsível que todo mundo sabe onde lhe encontrar. Exatamente o que seu editor faz quando aparece com a “proposta irrecusável”. Aloísio, aliás, é aquele “amigo da onça”; está sempre por perto de Geraldo querendo ajudar, mas só o coloca em furada.
A ideia da vez é mudar o rumo da revista, a qual não está bem das pernas. O que seria louvável, não fosse pela forma quase inquisitiva com a qual Geraldo recebe a missão de ser “o salvador da lavoura”. Eis que, segundo Aloísio, o livro que mais vende no momento é do gênero de autoajuda. Logo, nada melhor para alavancar os lucros do que escrever uma obra desse tipo.
|
Foto: Hanna de Paiva | Mundinho da Hanna |
O problema é que Geraldo nunca chegou nem perto de autoajuda. Para falar a verdade, acha até perda de tempo. Como que agora vai escrever um texto que nem ele acredita? Mas, vendo que não tem muito para onde fugir, especialmente depois da propaganda que seu amado (sqn) editor já fez por antecedência, acaba aceitando a missão, mesmo sabendo que pode dar tudo errado.
“Enfim, era a crise de homem branco hétero de barriga cheia. Me sentia péssimo.”
Assim, acompanhamos o processo de “pesquisa” e escrita do bendito livro. Bem como alguns personagens secundários inusitados, mas que deixam sua marca pelo caminho. Entre eles, temos Azazel, um diabinho na garrafa que mais atrapalha do que ajuda o protagonista.
A criatura é, literalmente, um demônio. Então, não é um dos personagens mais bonitinhos que você vai encontrar. Aliás, Geraldo tem tantas formas de descrever “seu amigo”, que por muito pouco não tive pesadelos (rsrsrs).
Contudo, o monstrinho é um personagem inteligente (quando quer), astuto e até cativante. Assim, não me espantaria se ele tivesse seu próprio livro (rsrsrs). A dupla que se forma é, por sua vez, improvável e rende diversas cenas engraçadas. Geraldo não se conforma com a companhia maligna em sua casa, mas também não pode dar fim nela. Pelo menos, enquanto não terminar sua missão.
Com muito sarcasmo, humor ácido e uma pitada de realidade, vemos ‘O Melhor Livro de Autoajuda do Mundo’ sendo escrito e publicado de uma forma nada convencional. Em adição, os papos entre esses dois deram tantos tapas na cara da sociedade, que me fizeram ficar refletindo dias depois – o que muito me surpreendeu.
Ao mesmo tempo, o Gabriel tem uma escrita fluida e direta, tornando a experiência de leitura mais positiva. Me mantive imersa com muita facilidade e consegui visualizar todas as situações que Geraldo passava, especialmente quando a obra ganhou uma repercussão inesperada.
“[…] quando se trata de livros de autoajuda, a gente sabe como começa, mas nunca como vai terminar.”
O que rendeu cenas tragicômicas, ao mesmo tempo que abrem espaço para diversos debates. Em especial, pelo lado de sociologia e filosofia.
|
Foto: Hanna de Paiva | Mundinho da Hanna |
O fato é que Geraldo apenas tentou escrever a verdade sobre o que via do mundo, com seu jeito D. Anésia de ser (além de dar espaço a uma bela crítica aos “coachs” super entendidos que vivem vendendo fórmulas mágicas para salvar a humanidade). Ele cutucou feridas e mostrou que as pessoas estão tão perdidas quanto seu próprio livro. Talvez por isso a obra seja tão ruim, que é boa.
O desfecho, como toda a trama, é sarcástico, crítico e crível (ou não). Finalizei a leitura com muitas risadas e reflexões, as quais precisei de dias antes de sentar e escrever a resenha.
Mesmo assim, ainda não sei se tudo o que comentei aqui faz jus ao que encontrei no ‘Melhor Livro de Autoajuda do Mundo’. Mas posso dizer que gostei muito e recomendo que leiam e tirem suas próprias conclusões.
Falando sobre o livro em si, li em versão digital. Então, posso falar que a diagramação está bem feita, assim como a revisão. A fonte é legível e a capa bem simples e objetiva.
Brenda Silva
Oii Hanna,
Adorei a resenha! Amo esses livros que ao mesmo tempo que nos fazem rir, alugam alguns triplex na nossa cabeça hahaha
Que bom que curtiu a leitura e obrigada por compartilhar sua experiência.
Beijos,
https://brenshelf.blogspot.com/
Hanna Carolina Lins
Acho que é uma definição perfeita para esse livro, viu? hahaha
Helaina Carvalho
Oi Hanna, já aconteceu de eu querer escrever uma resenha e não saber o que dizer sim, pra isso criei um roteiro. Basicamente perguntas que me direcionam ao que eu preciso falar. Com esse exercício acabo vencendo o bloqueio.
Ainda não conhecia o autor, e confesso que faz tempo que eu não leio um livro que me faça rir. Achei interessante a proposta desse. Dica anotada! 🙂
Abraço!
Helaina (Escritora || Blogueira)
https://hipercriativa.blogspot.com
Anônimo
Se a resenha já me fez imaginar cenas no libro e rir, imagina eu lendo kkkkkkkk
Acho até que me identificaria com o protagonista hehehe
Val.
Poesia na alma
Esse é o livro que se não fosse sua resenha, jamais chegaria perto, porque o título e a capa não me foram atrativos, mas, quanto mais lia seu texto, pensava, caramba, que genial. Parabéns pela resenha!
Debyh
Olá,
Você me convenceu a ler este livro no primeiro paragrafo hahahaha. Gosto de livros que ficam ali entre o sarcasmo e a reflexão, e com toda certeza lerei. Ótima indicação.
Erika Monteiro
Oi, tudo bem? Autoajuda é um tema bem subestimado, um pouco devido a cultura dos coachs no Brasil, e por outro lado o tema não ser tão valorizado como é nos EUA. Fiquei curiosa para conhecer. Um abraço, Érika =^.^=
Carol Nery
Oi, Hanna
Eu não conhecia o autor. E embora, de cara, a gente ache o título um tanto presunçoso… é preciso ler a resenha por completo pra se entender do que se trata. Né mesmo? Eu achei muito legal o que se propõe o livro. E super toparia ler uma história dessa para transitar entre um momento ou outro das minhas leituras tão pesadas e densas.
Foi bem legal sua forma de trazer essa resenha. Acho que acompanhou bem o espírito da "coisa", ou seja, do livro. Parabéns!
Até uma próxima. Beijocas
Luma Vieira
Acho que gostaria de ler este livro, o jeito "d. Anésia" de ser ficou bem interessante para minimizar a forma com que ele possa passar a mensagem ao expectador.
Hanna Carolina Lins
Olha só, adorei sua ideia, Helaina. Tentarei fazer isso nas próximas resenhas, =) E que bom que gostou da leitura. Super recomendo.
Hanna Carolina Lins
Não te julgo. Ele veio para dar esse estranhamento mesmo, haha
Hanna Carolina Lins
Ah, imagino sim! hahaha
Hanna Carolina Lins
Adorei! =)
Hanna Carolina Lins
Espero que goste da leitura também, Érika, =)
Hanna Carolina Lins
Sim, tem que ler ao menos a sinopse para ver do que o livro se trata e ver que tudo tem um motivo nesse livro, hehe. Feliz que gostou da resenha
Hanna Carolina Lins
Ah, então espero que leia. E espero que goste também, ^^