13 de January de 2019

Resenha do livro: O conto de Aia

Olá meu povo, como estamos? Sei que a postagem deveria ter saído ontem, mas não terminei o livro a tempo de mandar a postagem para o ar no dia 12, conforme o prometido. No entanto, antes tarde do que nunca (rsrsrs) e cá estou eu com a primeira resenha do projeto 12 livros para 2019.
O livro de janeiro foi ‘O conto da aia’, de Margaret Atwood.

 

O conto da aia
Foto: Divulgação

2/33

Livro: O conto da aia

Autora: Margaret Atwood

Editora: Rocco

Páginas: 366

Ano: 2017 (versão original 1985)

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A história de ‘O conto da aia’ passa-se num futuro muito próximo e tem como cenário uma república onde não existem mais jornais, revistas, livros nem filmes – tudo fora queimado. As universidades foram extintas. Também já não há advogados, porque ninguém tem direito a defesa. Os cidadãos considerados criminosos são fuzilados e pendurados mortos no muro, em praça pública, para servir de exemplo enquanto seus corpos apodrecem à vista de todos. Nesse Estado teocrático e totalitário, as mulheres são as vítimas preferenciais, anuladas por uma opressão sem precedentes. O nome dessa república é Gilead, mas já foi Estados Unidos da América. As mulheres de Gilead não têm direitos. Elas são divididas em categorias, cada qual com uma função muito específica no Estado – há as esposas, as Marthas, as salvadoras etc. À pobre Offred coube a categoria de aia, o que significa pertencer ao governo e existir unicamente para procriar. Offred tem 33 anos. Antes, quando seu país ainda se chamava Estados Unidos, ela era casada e tinha uma filha. Mas o novo regime declarou adúlteros todos os segundos casamentos, assim como as uniões realizadas fora da religião oficial do Estado. Era o caso de Offred. Por isso, sua filha lhe foi tomada e doada para adoção, e ela foi tornada aia, sem nunca mais ter notícias de sua família. É uma realidade terrível, mas o ser humano é capaz de se adaptar a tudo. Com esta história, Margaret Atwood leva o leitor a refletir sobre liberdade, direitos civis, poder, a fragilidade do mundo tal qual o conhecemos, o futuro e, principalmente, o presente.

 

O conto da aia

 

Estamos num futuro não muito distante, onde um país perdeu seu presidente e, logo em seguida, tudo virou de cabeça para baixo. Em meio a uma guerra que deixou os Estados Unidos a beira do colapso, graças a armas tóxicas, que causaram uma baixa incrível na taxa de natalidade, já que mais da metade da população se tornou estéril.
Junte-se a isso todo o caos que foi a tomada de poder e um país que era uma democracia, de repente se tornou uma ditadura onde toda sua população ou sofreu lavagem cerebral, ou foi obrigada a “se adaptar” para não ser expulso ou morto.
E assim os Estados Unidos se tornaram a República de Gilead, onde mulheres não podem mais ler, estudar, muito menos serem independentes. As que já eram ricas são agora chamadas Esposas, enquanto as que não tem poder aquisitivo tão alto, mas ainda podem ter filhos, são as Econoesposas. s senhoras mais velhas que eram solteiras, mas ainda podem trabalhar são chamadas Marthas. E as que eram divorciadas ou estavam tendo um relacionamento adúltero foram as escolhidas para serem Aias.
E as Aias estão numa posição dita importante, mas ao mesmo tempo são humilhadas quase que o tempo inteiro. A única função que lhes é atribuída é a de procriar e nada mais. As que não conseguem depois de um tempo são levadas para um lugar reservados às Não-Mulheres, um lugar onde vivem as viúvas, as lésbicas e todas as outras que estão estéreis. As Não-Mulheres são uma vergonha para toda a sociedade, que vive sob o comando das Tias e dos Comandantes. As Tias são senhoras que “ensinam” como as Aias devem se portar diante dos Comandantes, como devem gerar filho apenas e se mudarem de casa, para gerarem outros filhos. E o que elas faziam no passado (isso inclui trabalhar, estudar, namorar quem quiser), era errado, afinal mulheres não devem ter outra função a não ser viver em casa e cuidar de marido e filhos que as Aias geram. E mais, se ela por um acaso sofreram um tipo de abuso no passado, isso se devia às roupas que elas usavam, pois andar de biquíni numa praia, usar um short mais curto, era tudo motivo para que homens se aproveitassem delas… a culpa era delas pura e simplesmente…
Veem alguma semelhança com algo que algumas pessoas ainda tentam pregar? Pois é… agora imagina você se convencer de que a culpa realmente é sua e você agora deve pagar pelos seus pecados e apenas procriar?! E mais, você é apenas um veículo para que Esposas tenham bebês, que você nunca irá conhecer, pois estará em outra casa, fazendo outro bebê. Essa é a vida delas, principalmente da Offred, que nos conta sua história.
Ela não conta seu nome verdadeiro em momento algum, mas tem a nítida lembrança de quando era psicóloga formada, tinha amigos, um marido divorciado e uma filha pequena. De repente mulheres não podiam mais ter conta em banco, nem comprar nada, pois apenas homens poderiam administrar o poder aquisitivo delas. Ela não se conforma com o estado em que os Estados Unidos estão e resolve fugir com sua família para longe, mas eles acabam sendo pegos durante a fuga e separados de forma brutal.
Sem saber de nada sobre seu marido e filha, Offred “segue as regras” e tenta sobreviver numa sociedade onde ela não pode ter personalidade. Todos seguem uma bíblia (que só homens leem e falam qualquer coisa) que é dita ser apenas o Velho Testamento, onde temos uma visão um tanto mais crítica sobre casamentos, divórcios e opção sexual. E o que é mais pregado é exatamente que mulheres devem aceitar que Aias entrem em sua casa e tenham relações com seus maridos, para lhe dar os filhos que elas não podem mais ter.
E quem questionar, fizer algo que não é sua função ou for pego burlando regras, mesmo que sejam as mais simples, são julgados ao vivo na rede de televisão e enforcados, para purificar suas almas e servir de exemplo para outras pessoas, pendurados no Muro. O Muro é na verdade um muro de uma extinta universidade. Com o fim delas, das bibliotecas, jornais e qualquer fonte de conhecimento, foi fácil manipular as pessoas e fazê-las obedecerem. Logo foram feitas fogueiras enormes, onde foram queimados todo tipo de livros, revistas, fitas, dvd’s, qualquer coisa que induzissem ao pensamento crítico das pessoas e consequentes questionamentos. Afinal, um povo que lê é um povo que questiona. Se ele não tem onde se informar, se torna bem fácil acreditar em tudo o que dizem como verdade absoluta.

“Nosso grande erro foi ensiná-los a ler. Não faremos isso de novo.”
O conto da aia
Foto: Hanna de Paiva | Mundinho da Hanna

Homens mandam que mulheres fiquem em casa e lidem com filhos, comida e afazeres domésticos. E apenas eles tem o conhecimento de tudo o que aconteceu.
Offred, assim como outras Aias, se lembram de suas vidas passadas, de quando eram livres e podiam pensar por si só. Mas eram obrigadas a “esquecer” se quisessem sobreviver. Elas não podiam sair da república, não podiam falar com ninguém, nem com elas mesmas, a não ser que tivessem permissão para isso, e ainda tinham um diálogo próprio para isso, como robôs de carne e osso.
O que eu achei sobre esse livro? Falando a verdade… o livro é fino, de capítulos curtos e a linguagem da Margaret é fluida. Mesmo assim, precisei ter estômago para encarar tudo isso. Um futuro onde mulheres não tem mais voz, onde feminismo não existe, onde não podemos mais ir na esquina sem precisar de companhia de outra aia… não é isso o que espero que aconteça.
Os representantes de Gilead dizem que aquilo foi o melhor para que eles sobrevivessem ao mundo devastado pelas armas tóxicas. Mas apenas os Estados Unidos entraram nessa vibe de manipular sua população de uma forma, que pareciam até que viviam sob uma redoma de vidro.
Tudo o que tinha sido conquistado até o momento foi perdido quando tiraram a liberdade de pensamento do povo. E Offred sofre um bocado. Ela é levada a acreditar que tem uma posição incrível, já que é uma das poucas que ainda podem gerar vida. Mas com o fim da medicina como a conhecemos, gerar bebês para elas é algo humilhante. Eis que a cada mês, nos dias do período fértil das Aias, vão para o quarto a Esposa, o Comandante e a Aia. Enquanto a Esposa finge que está tendo relações com o marido, ela tem que assistir isso acontecer com a Aia. A não ser que seja um fetiche da pessoa (aí dentro de quatro paredes, cada um mostra o que quer), é uma situação no mínimo embaraçosa ver outra pessoa tendo relações com seu marido e ter que consentir, pois foi assim que o governo diz que Deus quis que acontecesse. E para a Aia pior ainda, literalmente é apenas um objeto que nem prazer pode sentir, é apenas um receptáculo que vai receber um bebê que não é seu no fim das contas.

 

“Não digo fazendo amor, porque não é o que ele está fazendo. Copular também seria inadequado porque teria como pressuposto duas pessoas e apenas um está envolvida. Tampouco estupro descreve o ato: nada está acontecendo aqui que eu não tenha concordado formalmente em fazer. Não havia muita escolha, mas havia alguma, e foi isso o que eu escolhi.”

 

“Para qual de nós duas é pior? Para ela ou para mim?”

 

Além disso, se elas entram em trabalho de parto, é um evento do ano; todas as mulheres, Esposas, filhas e Aias são convocadas a assistir. Sendo que no final, quem vem de verdade ficar na maca e receber atenção é a Esposa, enquanto a pobre da Aia tem que ficar escondida e praticamente sair andando, afinal não fez mais do que sua obrigação… Sinceramente, por mais que gerar vida seja um momento incrível, não vejo onde as Aias tem um papel tão importante assim, se são obrigadas a sair de cena para a Esposa que não fez nada, a não ser botar uma camisola branca e desgrenhar o cabelo, recebe todos os holofotes…
É uma situação nojenta, humilhante e ultrajante! E fica ainda pior quando Offred começa a cair nas graças do Comandante, mais do que deveria… começa com um jogo simples de tabuleiro, que logo vai parar na chamada Casa de Jezebel, que é na realidade o que seria um prostíbulo. Os homens de alto escalão podem pregar um mundo onde mulheres devem seguir os mandamentos e andar todas encapadas, para não gerar “olhares indevidos” (afina, a culpa é inteiramente das mulheres que andam de roupa curta, sqn), mas do que eles mesmos sentem mais falta é de pagar por um programa… irônico não? E Offred vai parar na Casa de Jezebel, e acaba descobrindo coisas que ela jamais imaginaria sobre o governo e sobre sua antiga amiga de faculdade, que havia sumido num dos treinamentos das Aias.

O conto da aia
Foto: Hanna de Paiva | Mundinho da Hanna

Sabendo dessas coisas, ela não pode mais ser a mesma, mas começa a correr perigo quando aparece a camionete preta na sua porta, anunciando que ela era acusada de crimes contra o governo. O que acontece com ela? Ninguém sabe, nem mesmo os estudiosos que tempos depois de Gilead cair, tentam de toda forma resgatar qualquer informação possível sobre um período sombrio que os Estados Unidos passaram.
O conto de aia não mostra uma mocinha forte e decidida, igual vemos em outras distopias. Mostra uma mulher que foi rebaixada e tinha medo de morrer. Isso não a faz menos fraca, afinal ela procurava respostas sobre seu passado e o que aconteceu com sua família. Mas ela, mesmo estando numa sociedade que dizia tanto que não precisava de feminismo, pois as mulheres agora eram tratadas da forma que mereciam… ela vê que não mereciam nada daquilo. Se seguissem as regras impostas por homens ditos poderosos, elas sobreviviam, mas continuavam sendo usadas como objetos, assim como eram em séculos passados. Não tinham voz, não tinham opinião, não tinham vida, apenas sobreviviam.
Além disso, Offred passou por cada situação que hoje seria motivo para processo por assédio e coisa pior, mas nessa sociedade é puramente normal, pois é só para isso que mulheres servem e ainda tem que ficar caladas.
Esse livro foi escrito em 1985 e, por conta de tanta coisa que vem acontecendo, voltou às altas nas livrarias, por conta de coisas que a gente sabe que são antigas, mas que infelizmente até hoje passamos. E talvez sirva até para pensarmos no quanto estamos evoluindo em nosso pensamento… ou melhor, podemos estar retrocedendo em muita coisa e infelizmente, esse livro é uma alternativa real do que pode acontecer em qualquer país do mundo, do jeito que as coisas andam ultimamente…

 

“Como todos os historiadores sabem, o passado é uma enorme escuridão, e repleto de ecos. Vozes podem nos alcançar a partir de lá; mas o que dizem é imbuído da obscuridade da matriz da qual elas vem; e, por mais que tentemos, nem sempre podemos decifrá-las precisamente à luz mais clara de nosso próprio tempo.”

O conto da aia
Foto: Hanna de Paiva | Mundinho da Hanna

Falando sobre o livro propriamente dito, eu amei a edição desse livro por dois motivos:

1. A capa chama a atenção. Sim eu julgo o livro pela capa muitas vezes…
2. Apesar de ter quase 400 páginas, é uma edição super levinha! Sério, carreguei comigo no trem e fui lendo sem dificuldade alguma, pois as páginas eram de fácil passada (papel póe]len, mas não tem a gramatura especificada), e o livro em si não me pesava no braço. Foi uma ótima experiência com esse estilo. Arrasou Rocco!

E na avaliação final, ganhou quatro estrelinhas, pois apesar da diagramação ser perfeita e tudo mais, a história, por mais fluida que seja, ainda ficou faltando alguma coisa na história que me prendesse mais um pouco…

O conto da aia
Foto: Hanna de Paiva | Mundinho da Hanna

Para quem não conhece a autora:

 

Uma das maiores escritoras de língua inglesa, a canadense Margaret Atwood foi consagrada com alguns dos mais importantes prêmios internacionais, como o Man Boker Prize, com ‘O assassino cego’ (2000), e o Príncipe de Astúrias, com todas as suas obras publicadas. Além do talento para o romance, Margaret escreve contos, poesias e ensaios, tendo até obras de ficção científica, como ‘Oryx e Crake’ e ‘O ano do dilúvio’.

Já leram ‘O conto da aia’? E as outras obras da autora, conhecem? Me contem aí!
Até mais!

Essa resenha faz parte dos projetos Leia Mulheres e #12livrospara 2019.

12 livros para 2019
Leia mulheres

Acompanhem também as resenhas dos livros escolhidos no MãeLiteratura e Pacote Literário.

 

Postado por:

Hanna de Paiva

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